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sábado, 2 de abril de 2016

VITICULTURA - LIMPEZA DO SARRO NOS TONÈIS







VINICULTURA - LIMPEZA DO SARRO NOS TONÉIS

 

 

 O Avô fora ferreiro, ao mesmo tempo era um pequeno industrial de agricultura, incluindo culturas vinícolas.
Tinha adega com lagar, um grande tonel com aduelas de madeira, por já não lhe fazer falta vendeu o maior por oitocentos escudos, uma quantia elevadíssima para a época.

A grande vasilha de vinte pipas, de vinte e cinco almudes cada, sendo o almude uma unidade de vinte litros.
Saiu pela porta da adega em quatro partes, com as respetivas aduelas tiradas dos arcos e pregadas a vimes.
Tal era a sua grandeza!

Agora o avô, que ficara entrevado aos quarenta anos, foi delegando ocupações aos filhos. o mais velho ficara com ofício de ferreiro, a seguir, o meu pai, ficou o abegão (tratador e trabalhador com os bois) o seguinte também aprendeu o ofício de ferreiro, o quarto foi carpinteiro, o quinto trabalhador do campo.

Mais três raparigas donas de casa.

Quando andava na escola havia a adega, lembro-me do grande tonel e da sua venda, mas ainda ficaram outros tonéis menores que eram cheios com a produção de uma das vinhas que ficara sempre para o avô cuidar do cultivo.
Produzia para venda e para prover a casa.

O lagar era alugado a quem o solicitasse, ao custo diário de um almude de vinho que também ali ficava armazenado.

A seu tempo, procedia à trasfega do vinho.
A borra que produzida era retirada e vendida a um comerciante do ramo, que trazia sacos brancos, onde metia o produto para transformar, creio que em bagaceira.

Depois de vendido, o vinho e consequentemente esvaziados os tonéis, era necessário proceder à sua criteriosa limpeza, coisa de que o avô sempre fora exímio, pois disso dependia em muito a qualidade do sabor do produto.
Saia sempre um verdadeiro néctar, com influência no preço, que o teor do mesmo justificava.

Tempos diferentes!...

Começava por mandar raspar o interior dos toneis com o fim de tirar todo o que chamava “sarro”:

Era ai que eu entrava, depois de solicitado os meus serviços ao pai.

Entrava dentro do tonel, por uma abertura que havia em todas as unidades, com uma escotilha, aberta logo que vazios, em cuja podia ser aplicada uma torneira em cavidade própria, até então tapada por uma rolha de cortiça ou por meio de um torno de vime, metido num pequeno furo produzido para o efeito, por uma verruma, para provar ou medir a graduação do vinho.

Dentro do tonel, era para mim um novo mundo, uma interessante aventura assinalada com cânticos, que dentro da vasilha soavam de maneira diferentemente, estranha e ampliada, que até o avô sempre ficava sorridente e cheio de complacência, na sua inegável austeridade, devia gozar enquanto de fora ia comandando a operação, com as suas interjeições ternas de comando:

- Olha limpa bem por cima!... Já limpastes bem, do lado direito?... E do esquerdo?... Agora raspa e limpa bem debaixo!...

Depois uma vassoura, para varrer tudo, para uma pá que o avô segurava de fora, depois deitava num saco, voltando com a mesma para encher de novo.

Tudo impecavelmente limpo, como era lei da casa.
O avô com contentamento dava, como prémio, uma moeda de cinquenta centavos.

Como tudo produzia dinheiro, dali por algum tempo passaria um comprador para o “sarro”.

O mesmo era acastanhado e brilhante.

Julgo saber que dele se extraía determinado químico.

 

Daniel Costa