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quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

PARQUE MAYER

Foto de Daniel Cordeiro Costa.
PARQUE MAYER

Depois foi destinado pela firma, a trabalhar na Avenida da Liberdade junto ao importante Café Lisboa, implantado num prédio que fazia esquina, com o beco a dar para o Parque Mayer. 
Naquela década de sessenta do século XX, era onde se processava toda a vida nocturna lisboeta, tanto mais, que as mais importantes casas da vida da noite também marcavam a sua presença a sua presença, quase em exclusivo, nas proximidades. Ao tempo, o mais famoso seria o Fontória, mas havia outros como o Maxime, o Passa Poga, assim como a casa de fados Márcia Condessa.
Sem razão para nostalgias, porque se sabia que a sociedade estava já em mutação e a energia a ser produzida com essa lenta mas verdadeira revolução, haveria de aniquilar tudo o que ia construindo.
Quem sabia aproveitar as oportunidades da mesma, depressa partiria para outra. Caso contrário ficaria banalizado e podia mesmo fenecer, o talento e a capacidade empreendedora dos que procuravam estar em destaque no seio de novos impulsos.
Faziam ainda fervilhar, na noite o Café Lisboa, duas tabacarias no mesmo prédio, uma pertencente à mesma empresa da Ginjinha Avenida, a outra integrada no próprio Café, o Bar Cantinho dos Artistas, sendo parte do Parque, mas com a entrada por fora deste, a Cervejaria Ribadouro, outro requinte nocturno, em actividade pela noite dentro, ali numa esquina a dar para a Rua do Salitre.
Foi destinado a servir naquele bar de Ginjinha pequeno mas conotado como um santuário por João Moisés, pois achava-o o máximo para o que pretendia. Ao iniciar o dia de trabalho, ocupava-se de tudo o que havia a fazer normalmente, a seguir dispunha numa gaveta o que tinha a decorar, a fim de ter tudo na mente para as aulas de liceu destinadas à manhã seguinte, isto em virtude de por aqueles sítios, a clientela ser rara a tal hora.
Depois do jantar e de, a intervalos de um dia, frequentar aulas de Inglês, chegava o verdadeiro serviço de atendimento e consequentemente o muito a observar.
Algumas vezes passavam fugazmente artistas de palco conhecidos, como o Tristão da Silva ou António Mourão ou outros ainda no início de uma carreira de que se falava e que não chegaria a frutificar.
Um dia apareceu o Francisco José, já célebre a tal ponto que, vindo de actuar no Brasil, no fim de um concerto, como se diria hoje, em directo na Radiotelevisão, se surpresa desatou a reivindicar dos baixos “cachets” pagos a artistas nacionais em relação a estrangeiros.
Todas as incidências do transcendente acto foram contadas ao vivo, para uma pequena mas interessada plateia, ali junta ao acaso, em jeito de reunião.
Do que fora “escândalo”, ali tratado parecia de efeito contrário, o artista à saída dos estúdios da Televisão, encontrou já vários elementos da PIDE, que o levaram de imediato para interrogatório policial, onde mostrou logo, que o que ia ser pago seria destinado na totalidade, a uma instituição de caridade, portanto até se podia dar ao luxo de fazer um acto de justiça, vedado a artistas sem a sua cotação.
Foi a última actuação na Televisão Portuguesa, de microfone aberto em directo, para evitar tentações futuras, como aquela do inimitável cantor romântico.
Durante a tarde, mesmo assim, apareciam por ali clientes de rosto familiar, que se tornavam previsíveis quanto a preferências, como o senhor Garcia, dono do Hotel Vitória, trabalhadores locais com as mais variadas ocupações e outros que diariamente passavam, além de forasteiros ocasionais.
Pela noite, era interessante o desfile de muitos trabalhadores do Parque Mayer, como os celebrados cenógrafos Pinto de Campos e Mário Alberto, que eram habituais. Também os empregados de mesa do famoso Café Lisboa, aproveitavam tempos menos preenchidos, para uma bebida, invariavelmente uma ginja com ou sem elas.
Servia-se um “cokteil”. Dito especialidade da casa e apareciam casais, relativamente novos, socialmente avançados na época. Os homens, num sussurro solicitavam o néctar, depois enquanto decorria o preparado voltavam a segredá-lo às mulheres, que pelo menos fingiam achar muita piada
Era o então celebrado “meninete”, uma palavra imprópria para ser pronunciada em público, demais na presença de senhoras!...
Faria já parte, como actualmente da linguagem de alcova.
O Parque com os seus teatros de Revista á Portuguesa, os restaurantes e o majestoso Café Lisboa subjacente eram, naqueles anos sessenta, como um eixo dum espaço onde começavam aqueles que faziam da noite o modo de se divertir e não só, porque também elementos da PIDE sempre de olhos abertos e ouvidos à escuta, ali iniciavam o trabalho. Alguns eram tão habituais que conseguiam tornar conhecido o seu modo de vida, outros menos vistos entravam num tipo de provocação, fingindo-se ébrios, tentando ouvir algo que os encaminhasse a iniciar investigações.
Estávamos em plena guerra de África, a viver uma República, apelidava-se de Estado Novo, tendo como Presidente Américo Tomás e Presidente do então chamado Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar que, por força, tinham de estar sempre representados e nada melhor do que ter alguém, com ferocidade suficiente em todos os lugares onde houvesse portugueses.
Daquela esquerda da Avenida da Liberdade, perto de grande Estátua aos Combatentes da Primeira Grande Guerra Mundial, podiam sair textos, que a dona Censura podia deixar passar, interpretados pelos elencos teatrais das Revistas, podiam fazer um explosivo a precisar de uma vigilância imbatível e constante.
Quem passava, de vez em quando, era um engraxador, como tantos que actuavam sobretudo na baixa de Lisboa, tinha sido pugilista de mérito, Belarmino Fragoso.
Já exibido o documentário, que já tinha protagonizado simplesmente designado por Belarmino, realizado por Fernando Lopes, baseava-se precisamente no desporto que o mesmo praticara.
Conheceu algum êxito, se considerarmos os poucos meios e o espaço cinematográfico nacional. 
Os comentários que passavam eram de que o realizador tinha ganho bom dinheiro, enquanto o artista principal nunca passou de uma pobreza envergonhada.
Podendo não ser acertados, estes não deixavam de ser atirados, mesmo nas barbas de agentes da polícia política, já que em nada beliscavam o regime vigente.
Entre os vários acontecimentos, que se podiam observar com faro de investigador, João Moisés reteve o de um casal de Ingleses. Estariam instalados num hotel da vizinhança.
De entre os prazeres proporcionados por uns dias de férias na capital europeia de Portugal, à noite contava a degustação de um saboroso licor, junto ao Parque de todos os sonhos.
Fazendo-se entender somente na língua de William Saskepeare, o homem travara certo entendimento com a, senhora engraçada e de fácil trato obviamente, sem que a simplicidade escondesse qualquer intenção, porém as boas gratificações não se faziam esperar.
Passaram uns meses, a mesma senhora entrava com outro acompanhante, mesmo não sendo necessário qualquer aviso, já a dama estava, por detrás a exibir o sinal para não haver palavras, sobre o passado.
A partir daí o novo par constituído apareceu por mais dias e a senhora voltou ao fraternal bate papo habitual.
Isto foi sempre lembrado, porque aquele tipo se “serviço” ainda estava longe de ser vulgar, mesmo na grande Lisboa de sessenta do século passado.
Um dia à tarde apareceu outro tipo de cliente, nunca tinha sido visto por ali, vestido a rigor, de facto a sua aparência mais a de provinciano tipo “Chico esperto”, empunhando a sua bebida, solicitou o empréstimo de certa quantia, em seu abono, dizia-se oficial do exército, prestes a ter um encontro com uma miúda e faltava-lhe dinheiro.
Obviamente obteve uma negativa, alegadamente por o João Moisés não possuir a quantia. Sugeriu o impensável:
- Retirar a importância da caixa registadora!...
Para a sua propensão a investigar certos factos gregários, todas as noite, depois das duas da madrugada, durante meses, descia a Avenida da Liberdade, onde tomava o rumo do Largo Martim Moniz a caminho do bairro da Graça, localização da sua morada.
Devido ao avanço nocturno apenas encontrava algumas meretrizes, em fim de trabalho nos Restauradores, que procuravam a oportunidade de insinuar-se, Nunca se meteram, deviam conhecer o habitual transeunte, que não era parte dos ocasionais clientes.
Embora o João viesse amando a doce existência naquela ocupação, onde era tratado como achava merecer, tendo adquirido mais formação académica, com ambições mais elevadas, em breve encetou novos voos.
Depois foi destinado pela firma, a trabalhar na Avenida da Liberdade junto ao importante Café Lisboa, implantado num prédio que fazia esquina, com o beco a dar para o Parque Mayer.
Naquela década de sessenta do século XX, era onde se processava toda a vida nocturna lisboeta, tanto mais, que as mais importantes casas da vida da noite também marcavam a sua presença a sua presença, quase em exclusivo, nas proximidades. Ao tempo, o mais famoso seria o Fontória, mas havia outros como o Maxime, o Passa Poga., assim como a casa de fados Márcia Condessa.
Sem razão para nostalgias, porque se sabia que a sociedade estava já em mutação e a energia a ser produzida com essa lenta mas verdadeira revolução, haveria de aniquilar tudo o que ia construindo.
Quem sabia aproveitar as oportunidades da mesma, depressa partiria para outra. Caso contrário ficaria banalizado e podia mesmo fenecer, o talento e a capacidade empreendedora dos que procuravam estar em destaque no seio de novos impulsos.
Faziam ainda fervilhar, na noite o Café Lisboa, duas tabacarias no mesmo prédio, uma pertencente à mesma empresa da Ginjinha Avenida, a outra integrada no próprio Café, o Bar Cantinho dos Artistas, sendo parte do Parque, mas com a entrada por fora deste, a Cervejaria Ribadouro, outro requinte nocturno, em actividade pela noite dentro, ali numa esquina a dar para a Rua do Salitre.
Foi destinado a servir naquele bar de Ginjinha pequeno mas conotado como um santuário por João Moisés, pois achava-o o máximo para o que pretendia. Ao iniciar o dia de trabalho, ocupava-se de tudo o que havia a fazer normalmente, a seguir dispunha numa gaveta o que tinha a decorar, a fim de ter tudo na mente para as aulas de liceu destinadas à manhã seguinte, isto em virtude de por aqueles sítios, a clientela ser rara a tal hora.
Depois do jantar e de, a intervalos de um dia, frequentar aulas de Inglês, chegava o verdadeiro serviço de atendimento e consequentemente o muito a observar.
Algumas vezes passavam fugazmente artistas de palco conhecidos, como o Tritão da Silva ou António Mourão ou outros ainda no início de uma carreira de que falava e que não chegaria a frutificar.
Um dia apareceu o Francisco José, já célebre a tal ponto que, vindo de actuar no Brasil, no fim de um concerto, como se diria hoje, em directo na Radiotelevisão, se surpresa desatou a reivindicar dos baixos “cachets” pagos a artistas nacionais em relação a estrangeiros.
Todas as incidências do transcendente acto foram contadas ao vivo, para uma pequena mas interessada plateia, ali junta ao acaso, em jeito de reunião.
Do que fora “escândalo”, ali tratado parecia de efeito contrário, o artista à saída dos estúdios da Televisão, encontrou já vário elementos da PIDE, que o levaram de imediato para interrogatório policial, onde mostro logo que o que ia ser pago seria destinado na totalidade, a uma instituição de caridade, portanto até se podia dar ao luxo de fazer um acto de justiça, vedado a artistas sem a sua cotação.
Foi a última actuação na Televisão Portuguesa, de microfone aberto em directo, para evitar tentações futuras, como aquela do inimitável cantor romântico.
Durante a tarde, mesmo assim, apareciam por ali clientes de rosto familiar, que se tornavam previsíveis quanto a preferências, como o senhor Garcia, do Hotel Vitória, trabalhadores locais com as mais variadas ocupações e outros que diariamente passavam, além de forasteiros ocasionais.
Pela noite, era interessante o desfile de muitos trabalhadores do Parque Mayer, como os celebrados cenógrafos Pinto de Campos e Mário Alberto, que eram habituais. Também os empregados de mesa do famoso Café Lisboa, aproveitavam tempos menos preenchidos, para uma bebida, invariavelmente uma ginja com ou sem elas.
Servia-se um “cokteil”. Dito especialidade da casa e apareciam casais, relativamente novos, socialmente avançados na época. Os homens, num sussurro solicitavam o néctar, depois enquanto decorria o preparado voltavam a segredá-lo às mulheres, que pelo menos fingiam achar muita piada
Era então celebrado “meninete”, uma palavra imprópria para ser pronunciada em público, demais na presença de senhoras!...
Faria já parte como actualmente d linguagem de alcova.
O Parque com os seus teatros de Revista á Portuguesa, os restaurantes e o majestoso Café Lisboa subjacente eram, naqueles anos sessenta, como um eixo dum espaço onde começavam aqueles que faziam da noite o modo de se divertir e não só, porque também elementos da PIDE sempre de olhos abertos e ouvidos à escuta, ali iniciavam o trabalho. Alguns eram tão habituais que conseguiam tornar conhecido o seu modo de vida, outros menos vistos entravam num tipo de provocação, fingindo-se ébrios, tentando ouvir algo que os encaminhasse a iniciar investigações.
Estávamos em plena guerra de África, a viver uma República, apelidava-se de Estado Novo, tendo como Presidente Américo Tomás e Presidente do então chamado Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar que, por força, tinham de estar sempre representados e nada melhor do que ter alguém, com ferocidade suficiente em todos os lugares onde houvesse portugueses.
Daquela esquerda da Avenida da Liberdade, perto de grande Estátua aos Combatentes da Primeira Grande Guerra Mundial, podiam sair textos, que a dona Censura podia deixar passar, interpretados pelos elencos teatrais das Revistas, podiam fazer um explosivo a precisar de uma vigilância imbatível e constante.
Que passava de vez em quando era um engraxador, como tantos que actuavam sobretudo na baixa de Lisboa, tinha sido pugilista de mérito, Belarmino Fragoso.
Já exibido o comentário, que já tinha protagonizado simplesmente designado por Belarmino, realizado por Fernando Lopes, baseava-se precisamente no desporto que o mesmo praticara.
Conheceu algum êxito, se considerarmos os poucos meios e o espaço cinematográfico nacional. 
OS comentários que passavam eram de que o realizador tinha ganho bom dinheiro, enquanto o artista principal nunca passou de uma pobreza envergonhada.
Podendo não ser acertados, estes não deixavam de ser atirados, mesmo nas barbas de agentes da polícia política, já que em nada beliscavam o regime vigente.
Entre os vários acontecimentos, que se podiam observar com faro de investigador, João Moisés reteve o de um casal de Ingleses. Estariam instalados num hotel da vizinhança.
De entre os prazeres proporcionados por uns dias de férias na capital europeia de Portugal, à noite contava a degustação de um saboroso licor, junto ao Parque de todos os sonhos.
Fazendo-se entender somente na língua de William Saskepeare, o homem travava certo entendimento com a, senhora engraçada e de fácil trato obviamente, sem que a simplicidade escondesse qualquer intenção, porém as boas gratificaç~es não se faziam esperar.
Passaram uns meses, a mesma senhora entrava com outro acompanhante, mesmo não sendo necessário qualquer aviso, já a dama estava, por detrás a exibir o sinal para não haver palavras, sobre o passado.
A partir daí o novo par constituído apareceu por mais dias e a senhora voltou ao fraternal bate papo habitual.
Isto foi sempre lembrado, porque aquele tipo se “serviço” ainda estava longe de ser vulgar, mesmo na grande Lisboa de sessenta do século passado.
Um dia à tarde apareceu outro tipo de cliente, nunca tinha sido visto por ali, vestido a rigor, de facto a sua aparência mais a de provinciano tipo “Chico esperto”, empunhando a sua bebida, solicitou o empréstimo de certa quantia em seu abono, dizia-se oficial do exército, prestes a ter um encontro com uma miúda e faltava-lhe dinheiro.
Obviamente obteve uma negativa, alegadamente por o João Moisés não possuir a quantia. Sugeriu o impensável:
- Retirar a importância da caixa registadora!...
Para a sua propensão a investigar certos factos gregários, todas as noite, depois das duas da madrugada, durante meses, descia a Avenida da Liberdade, onde tomava o rumo do Largo Martim Moniz a caminho do bairro da Graça, localização da sua morada.
Devido ao avanço nocturno apenas encontrava algumas meretrizes, em fim de trabalho nos Restauradores, que procuravam a oportunidade de insinuar-se, Nunca se meteram, deviam conhecer o habitual transeunte, que não era parte dos ocasionais clientes.
Embora o João viesse amando a doce existência naquela ocupação, onde era tratado como achava merecer, tendo adquirido mais formação académica, com ambições mais elevadas, em breve encetou novos voos.

Daniel Costa

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